quarta-feira, 18 de março de 2015

MAS, O QUE É O THELENISMO OU O QUE SÃO OS THELÊNICOS III?

Aleister Crowley

Aleister Crowley (18751947) foi um ocultista, montanhista, pintor e escritor inglês. Em 1904, em uma experiência mística, teve o Livro da Lei ditado a ele por uma entidade denominada Aiwass, livro sagrado que atua como pedra fundamental para o sistema filosófico, religioso, social e mágico chamado Thelema.


O Livro da Lei

O sistema thelêmico tem início com a escritura do Livro da Lei, cujo nome oficial é Liber AL vel Legis. Foi escrito no Cairo, Egito, durante a lua de mel de Crowley e sua primeira esposa, Rose Kelly. Este pequeno livro contém três capítulos, cada um escrito durante o período entre o meio-dia e as 13h00, dos dias 8, 9 e 10 de abril de 1904. Crowley dizia que escreveu o livro segundo o que lhe foi
ditado por uma entidade "preter-humana" de nome Aiwass, a qual posteriormente identificou como sendo o seu próprio Sagrado Anjo Guardião. Israel Regardie, discípulo e secretário particular de Crowley, preferia atribuir a voz ao próprio subconsciente de Crowley, mas as opiniões sobre a identidade de Aiwass variam enormemente entre os thelemitas. Apesar das referências a Rabelais, a análise de Dave Evans do Livro da Lei apresenta maiores semelhanças com o texto "O Amado de Hathor e a Capela do Gavião Dourado", peça de Florence Farr, do que com "Gargantua e Pantagruel". Evans diz que isso pode resultar do fato de que tanto Farr quanto Crowley terem sido membros da Ordem Hermética da Aurora Dourada e dela tenham absorvido os ensinamentos e a simbologia, e que Crowley talvez conhecesse o material anterior e tenha se inspirado nos textos de Farr. Sutin também encontra similaridades com o trabalho de W. B. Yeats, atribuindo tais similaridades a "inspirações compartilhadas" (como uma espécie de zeitgeist) ou talvez ao conhecimento por parte de Yeats do trabalho do próprio Crowley.
Crowley escreveu vários comentários sobre o Livro da Lei, o último dos quais em 1925. Este breve trabalho, intitulado apenas "O Comento" avisa sobre os perigos do estudo do Livro e da discussão de seu conteúdo, deixando claro que:
"Todas as questões da Lei são para serem decididas apenas por apelos aos meus escritos, cada pessoa por si mesma".

Verdadeira Vontade

De acordo com Crowley, todo indivíduo é dotado de uma Verdadeira Vontade, a qual deve ser diferenciada das vontades ordinárias e dos desejos do Ego. A Verdadeira Vontade é, essencialmente, o "chamado" ou "propósito" da vida de alguém. Alguns magos recentes concluem que o ato de chegar à auto-realização deve ser feito por seus próprios esforços, sem a ajuda de Deus ou qualquer outra
Frontstpício do Liber AL vel Legis, o Livro da Lei .
autoridade divina. De trabalhos como o "Liber II - A Mensagem de Mestre Therion" pode-se entender que a Verdadeira Vontade do indivíduo é nada mais que uma porção da própria Vontade Divina. "Faze o que tu queres será o todo da Lei" não se refere ao hedonismo, acatando-se qualquer desejo mundano, mas no atender do chamado desse propósito maior. O thelemita é um místico que, de acordo com Lon Milo Duquette, baseia suas ações no sentido de descobrir e executar essa Vontade; quando alguém a realiza é como se encontrasse sua própria órbita entre os demais corpos celestes na ordem universal, e o universo passa a auxiliá-lo. Não se deve confundir esta ideia com a chamada "Lei da Atração", apresentada pelo Movimento Novo Pensamento. Thelema não implica o desejo por algo, mas sim a descoberta da sua própria natureza íntima, de modo a se alcançar paz e unidade com o Universo. De forma a alguém se tornar capaz de seguir sua Verdadeira Vontade, as inibições instiladas pela sociedade no Self devem ser quebradas por um processo de descondicionamento. Crowley acreditava que isso seria alcançado pela libertação de todos os desejos inconscientes e pelo controle damente consciente, especialmente das restrições colocadas à expressão sexual, que é associada ao poder da criação divina. Thelema associa a Verdadeira Vontade de cada indivíduo com o Sagrado Anjo Guardião, o daimon único de cada ser humano. A busca espiritual para se alcançar e cumprir essa Verdadeira Vontade também é conhecida em Thelema como parte da chamada Grande Obra.

Cosmologia

·         Nuit: representada na arte antiga como uma mulher cujo corpo estrelado e curvado é a própria abóboda celeste. Ela é percebida como a Grande Mãe, a fonte primal de todas as coisas. Está ligada ao Primeiro Capítulo do Livro da Lei.
·         Hadit: o ponto infinitesimal, complemento e consorte de Nuit. Hadit simboliza a manifestação, o movimento e o tempo. Também é descrito no Livro da Lei como "a chama que queima em todo coração humano, e no âmago de cada estrela" (Liber Al vel Legis II:6). Está ligado ao Segundo Capítulo do Livro da Lei.
·         Ra-Hoor-Khuit: uma das manifestações de Hórus. Ele é simbolizado como o homem entronado com cabeça de falcão, carregando um cetro. É associado ao Sol e às energias ativas na magia thelêmica. Está ligado ao Terceiro Capítulo do Livro da Lei.
Outras divindades de importância em Thelema são:
·         Hoor-Paar-Kraat (ou Harpócrates): deus do silêncio e da força interior, irmão e contraparte de Ra-Hoor-Khuit.
·         Babalon: a deusa de todos os prazeres, conhecida como a Prostituta Sagrada, também ligada ao conceito da Grande Mãe e pertencente à linhagem de arquétipos de Inanna, Astarte, Afrodite, dentre outras.
·         Therion: a besta montada e controlada por Babalon, que representa o aspecto viril e dinâmico da Natureza, além das forças naturais do ser humano.

 

Magia e Ritualística

Thelema possui um conjunto próprio de práticas mágicas que recebe o nome de "Magick". Esta denominação foi utilizada por Crowley (a partir da forma vitoriana do termo "magic") para diferenciar seu sistema mágico da magia de salão, também conhecida como ilusionismo ou prestidigitação (no idioma inglês, não existem termos distintos paramagia e mágica). É um sistema metafísico completo, englobando exercícios e práticas que buscam levar o adepto ao encontro de seu Sagrado Anjo Guardião e, através dele, ao conhecimento da Verdadeira Vontade e sua consecução. Crowley foi um autor prolífico, integrando práticas místicas orientais com práticas ocultistas ocidentais, muitas advindas do trabalho da Aurora Dourada. Ele recomendava uma série básica destas práticas a seus discípulos, incluindo o básico do Yoga (asana e pranayama), o Ritual Menor do Pentagrama, da Aurora Dourada, a Missa da Fênix e o Liber Resh, sendo que este último consiste de quatro adorações diárias ao Sol (representando o Self). São também práticas criadas ou recomendadas por Crowley várias de magia sexual e de origem gnóstica. Muito de seu trabalho pode ser encontrado tanto em livros como o "Magick Without Tears" ("Magick sem Lágrimas") e o "Gems of the Equinox" ("Jóias do Equinox"), bem como em diversos sites da Internet.
Em ordens thelêmicas como a Ordo Templi Orientis ou a Astrum Argentum o trabalho mágico é feito através de uma série de graus iniciáticos. Thelemitas que seguem seus caminhos de forma autônoma costumam se basear em trabalhos de Crowley disponíveis publicamente como um guia e em sua própria intuição.



A ênfase da magia thelêmica não é a obtenção de resultados materiais (para tanto, os thelemitas costumam recorrer a outros sistemas mágicos como a Goécia, a Sigilização ou a Feitiçaria), mas sim no desenvolvimento espiritual através do auto-conhecimento e do contato com o Sagrado Anjo Guardião, sendo este seu principal objetivo. Este contato consciente é conhecido como o "Conhecimento e Conversação do Sagrado Anjo Guardião" e leva ao conhecimento da Verdadeira Vontade. Ainda que Crowley considerasse o Sagrado Anjo Guardião como uma entidade separada da pessoa, muitos thelemitas atuais o vêem como uma manifestação do Self, isto é, o centro da totalidade psíquica do ser humano, o que para a psicologia jungiana, equivale a Deus.
Nas linhas de trabalho por graus mágicos, os Graus mais altos são alcançados através do cruzar do Abismo com o auxílio do Sagrado Anjo Guardião e o abandonar do Ego. Contudo, caso o adepto não esteja preparado adequadamente, será tragado por seu próprio ego, tornando-se um Irmão Negro. Dessa maneira, em vez de se tornar uno com Deus, derramando seu sangue na taça de Babalon e se abrindo pela fórmula do Amor para todo o Universo, o Irmão Negro passa a considerar seu Ego como sendo Deus, fechando-se nele. De acordo com Crowley, o Irmão Negro desintegra-se gradualmente, passando a depender da adoração de outras pessoas para seu próprio auto-engrandecimento.
Crowley pregava um exame cético sobre todos os resultados obtidos através da meditação ou da magia. Ele insistia na necessidade da manutenção de um diário mágico, que deveria conter todas as condições observáveis de um evento para posterior análise e comparação. Com isso, buscava uma metodologia para a experiência mística ou mágica semelhante à metodologia empregada pela ciência tradicional e, com isso, separar ''Magick'' do misticismo barato e da superstição. Crowley definia Magick como "o método da ciência e o objetivo da religião", alegando que toda experiência mágica deveria ser passível de comprovação e repetição não acidental. Sendo a magia, porém, uma ciência empírica, os resultados são quase sempre subjetivos, de modo que o que pode ser visto como sucesso por um praticante pode ser entendido como fracasso por outro ou como fantasia por um cético. Contudo, a ideia é que se um mesmo praticante repete o mesmo processo nas mesmas condições, os resultados obtidos devem ser reconhecíveis como sendo suficientemente próximos para que se aceitem como verdadeiros.


Não é necessário, entretanto, que se pratique qualquer forma de sistema mágico para ser um thelemita. Considera-se como sendo um thelemita todo aquele que aceita o Livro da Lei como seu livro sagrado e siga a filosofia ali expressa segundo suas próprias interpretações.

Ética

O Liber AL vel Legis coloca alguns preceitos básicos para a conduta individual. O principal é o "Faze o que tu queres", que representa tanto a primeira instância da Lei como um direito inerente a todo ser humano. Posto que os thelemitas utilizam a Lei de Thelema também como um cumprimento, entende-se que esse direito inclui a obrigação de permitir que o outro cumpra também sua Vontade sem interferências, ainda que tal pensamento não esteja presente no Liber AL vel Legis de forma explícita.
Ainda que Crowley tenha dito não haver necessidade de se detalhar uma ética thelêmica, uma vez que tudo está incluso na própria Lei de Thelema, escreveu vários documentos apresentando sua visão pessoal de conduta individual à luz da Lei thelêmica, sendo que alguns fazem referência à questão da interferência sobre o caminho alheio, sendo eles "Liber Oz", "Dever", "Liber II". "Liber Oz", considerado por muitos como uma Carta de Direitos Humanos, enumera uma série de direitos individuais derivados do "Faze o que tu queres", que incluem, entre outros, o direito de viver por sua própria lei, trabalhar como desejar, morrer como e quando desejar, amar quem, como e quando desejar, etc... Estas declarações, contudo, não devem ser interpretadas como uma licença para que se ignore a legislação ou o direito alheio, uma vez que em Thelema considera-se que cada um deve assumir integralmente a responsabilidade por seus atos e suas consequências.
"Dever" é descrito como "uma nota sobre as principais práticas de conduta a serem observadas por aqueles que aceitam a Lei de Thelema". Divide-se em quatro sessões:
·         A - Seu dever para consigo mesmo: descreve o Self como o centro do universo, com um chamado a que cada um aprenda sua natureza interna. Incita o leitor a desenvolver cada faculdade sua de forma equilibrada, estabelecendo sua própria autonomia e devotando-se ao serviço de sua própria Verdadeira Vontade.
·         B - Seu dever para com os outros: explica que se deve eliminar a ilusão de que exista uma separação entre alguém e todos os outros, a lutar quando necessário, a evitar a interferência com a Vontade alheia, a iluminar os outros quando necessário e a adorar a natureza divina de todas os outros seres.
·         C - Seu dever para com a Humanidade: coloca que a Lei de Thelema deveria ser a única base de conduta, que as leis mundanas deveriam ter como objetivo assegurar a liberdade maior de cada indivíduo, sendo o crime descrito como uma violação da Verdadeira Vontade de alguém.
·         D - Seu dever para com todos os outros seres e coisas: diz que a Lei de Thelema deveria ser aplicada a todos os problemas e usada para se decidir toda questão ética, sendo uma violação da Lei utilizar um animal ou objeto para um propósito distinto daquele para o qual foi criado, tal como arruinar algo de forma que se torne inútil a seu propósito. Os recursos naturais podem ser utilizados pelo ser humano, mas isso deve ser feito sabiamente ou a quebra da Lei seria vingada, como por exemplo o desflorestamento causando erosão do solo ou o desmatamento de encostas ocasionando deslizamentos).
Em "Liber II - A Mensagem de Mestre Therion", a Lei de Thelema é apresentada sucintamente como sendo "Faze o que tu queres, então não faça mais nada". Crowley descreve a busca da Vontade não apenas como alheia a qualquer resultado como também com incansável energia. É o Nirvana alcançado e mantido de forma dinâmica e não estática. A Verdadeira Vontade é descrita como uma órbita individual e os obstáculos que impedem sua consecução devem ser eliminados.
De forma geral, cada thelemita é instigado a estabelecer seu próprio código de conduta e sua própria ética, de acordo com sua interpretação individual do Livro da Lei e de sua própria experiência de vida, seus estudos e suas conclusões. Em Thelema um código padronizado de conduta é impossibilitado pela inexistência de dogmas ou interpretações oficiais ou "corretas" de qualquer um de seus textos sagrados.

O Fim do Aeon

Ao contrário da absoluta maioria das religiões, que se baseiam em uma continuidade eterna de suas verdades espirituais, dentro do próprio Liber AL vel Legis já se prenuncia o fim da validade da fórmula atual de Thelema (Liber AL III:34), na chamada queda do Grande Equinócio:
"Quando Hrumachis erguer-se-á e aquele da dupla baqueta assumirá meu trono e lugar, um outro profeta deverá erguer-se, e trazer febre fresca dos céus. Uma outra mulher despertará a volúpia e a adoração da Serpente. Uma outra alma de Deus e da besta misturar-se-á no sacerdote englobado, um outro sacrifício maculará a tumba. Um outro rei deverá reinar e a bênção não mais será derramada ao místico Senhor da cabeça de Falcão".
Isso se deve à ideia thelêmica de que a evolução espiritual humana baseia-se em ciclos, chamados Aeons, cada um regido por um arquétipo, normalmente representado por uma divindade egípcia. Até hoje dois ciclos foram completados:
·         Aeon de Ísis: a época da Deusa Mãe, quando o ser humano cultuava os aspectos femininos da criação. O ser humano é visto espiritualmente como um bebê de colo.
·         Aeon de Osíris: a época do Deus Pai, quando os aspectos masculinos da ordem e do sacrifício eram cultuados. Entende-se o ser humano espiritualmente como uma criança que já não mais se nutre do leite materno, porém necessita ainda do amparo e da disciplina paternas.


Thelema atua dentro do terceiro ciclo, o chamado Novo Aeon:
·         Aeon de Hórus: a época do Deus Interior, na qual se cultua a individuação (não o individualismo), nos aspectos hermafroditas, equilibrando o masculino e o feminino. O ser humano evolui até a maturidade, não necessitando mais de divindades externas, tornando-se ele próprio seu deus e redentor.


Crowley presume que o próximo Aeon, que deve ocorrer por volta do ano 3900, será o de Maat, a deusa egípcia da Justiça, quando a fórmula atual já terá cumprido seu objetivo e não será mais necessária, devendo deixar um novo pensamento tomar lugar no mundo.

FONTE: http://pt.wikipedia.org/wiki/Thelema

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